Cabral Poeta

Dizem os entendidos que Cabral nasceu poeta e fez-se soldado das causas do humanismo. O professor americano Gérald Moser considera que ele faz poesia, mesmo quando escreve um relatório. Os poemas dele dados à estampa, quer por Mário de Andrade, quer por Osvaldo Osório em A Emergência da Poesia de Amílcar Cabral (1984 e 1918), testemunham a sua veia poética, levando o Professor americano Hamilton Russel a declarar que:

“… Amílcar Cabral, na sua adolescência e juventude, compôs poemas cuidadosamente elaborados em termos de forma e de conteúdo” (CCE:664).

Para ilustrar a afirmação acima referida, citaremos dois extratos: um do poema Rosa Negra e outro do poema Regresso.

No primeiro, escreve o poeta:

“… Chamam-te Rosa, minha preta formosa (…) // Mas temo a tua sorte na vida que vives…!”

Antevendo, porém um futuro diferente para a sua Rosa Negra, prossegue:

“… minha preta formosa, amanhã terás filhos / mas também amanhã… / amanhã terás vida”.

E a vida anunciada não será uma oferta. Será uma conquista que a luta de libertação, seguramente há-de trazer. Daí que no segundo poema o poeta, confiante, anuncie:

“Mamãi Velha, venha ouvir comigo / o bater da chuva lá no seu portão / É um bater de amigo / que vibra dentro do meu coração. ( …) // Ouvi dizer que a Cidade Velha. / – a ilha toda / Em poucos dias já se virou jardim…”.

A fé de Cabral, de que a Independência, fruto da luta pela liberdade e dignidade chegaria um dia, era enorme. Então, a Cidade Velha, metáfora de Cabo Verde, e as ilhas todas se transformaram num “jardim”, porque “a chuva tinha falado mantenha” e a liberdade passaria a ser uma realidade nos lares, no campo, nas cidades e até nos corações de todos os cabo verdianos, de todos os africanos oprimidos e dominados.

O seu assassinato, a 20 de Janeiro de 1973, não lhe permitiu sentir “o bater da chuva” lá no portão das ilhas, mas isso não impediu que os seus continuadores empunhassem a bandeira da luta até ao dia grande em que soou o hino da liberdade.

Cabral, como poeta visionário que era, já tinha previsto que o sacrifício da sua vida e o da de vários outros combatentes seriam a força anímica que catapultaria a Guiné e Cabo Verde à Independência. Aliás, num repente de luz e de clarividência, ele escrevera quando tinha pouco mais de 20 anos de idade:

“…não sei se não serei um dos que ficarão pelo caminho…

Mas com o meu filho não será o mesmo. Ele há-de viver a vida por que anseio, hão-de ser para ele realidades as minhas esperanças de hoje…” CV – RM: 29-30).

A profecia de Cabral acabou por concretizar-se. Hoje, no Cabo Verde independente a vida flui; a liberdade e o Estado de Direito são um património; o desenvolvimento é um processo, porque o sonho do nosso povo não tem limites. Aliás, Ovídio Martins, um outro poeta da geração de Cabral escreveu alguns anos após a nossa Independência:

“Cá vamos nós construindo o país (…) // Dor a dor. Amor a amor”.

É tudo isto que fez e faz da luta de libertação um ato de cultura. O nosso hino e a nossa bandeira têm a cumplicidade da luta armada, mas uma luta cujo objetivo era a construção da paz e a garantia de um desenvolvimento que promovesse o humanismo e o Estado de Direito Democrático.

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